“Meu filho está com problemas no desempenho escolar, além disso fica muito isolado dos colegas na escola.” E o profissional pergunta “Ele tem amigos?”, e a mãe responde “Sim, no Facebook tem muitos”, o profissional sorri brevemente e refaz a pergunta “Quero dizer, ele tem amigos que ele visita ou visitam ele?”, a mãe responde “Isso não, porquê? Seria um problema?”, o profissional responde “Talvez, por enquanto estou apenas investigando. Ele tem dificuldade para fazer mais alguma coisa que as crianças da idade dele já fazem?”, e mãe responde “Sim, ele tem medo de tudo, parece que ele não confia nele mesmo para nada”, o profissional continua a investigação “E quando ele faz alguma coisa ‘errada’ sem querer, o que você faz?”, a mãe responde “eu explico que ‘não pode’, sempre converso”, o profissional insiste “Só conversa? Ou às vezes não faz nada?”, a mãe confirma “Às vezes eu converso, às vezes eu ignoro, pois me dá muito trabalho ficar conversando sempre”. O profissional avança na investigação “E quando ele pede alguma coisa e ouve um ‘não’, como ele reage?” a mãe responde “Ele insiste e eu acabo cedendo para não ouvir choradeira”, e profissional aprofunda “Sim, e quando ele pede algo que está totalmente fora do seu alcance?” a mãe diz “ele passa muito tempo chorando, eu não aguento, perco a paciência e acabo batendo nele.” A mãe começa a chorar, e no meio das lágrimas diz “Eu não sei onde está o problema, eu dou todo o carinho e afeto que ele precisa, dou tudo do bom e do melhor, não cobro ele de nada”, e o profissional finaliza “Talvez seja este o problema”. Conversas assim têm sido cada vez mais frequente nos consultórios que atendem pais de crianças e adolescentes. Pais com este perfil demonstram muita dificuldade para estabelecer regras e limites, e para falar o que esperam do filho. Às vezes chamam a atenção do filho, e outras vezes não, normalmente ficam aborrecidos com algo que o filho fez, mas não o deixam saber disso. Esses pais relatam que se sentem muito sobrecarregados com o filho, em geral não aguentam os pedidos, os choros e as discussões e acabam fazendo o que o filho quer. Eles acreditam que o filho deve expressar todos os desejos e impulsos para se desenvolver. A conclusão disso é uma criança (ou um jovem) que tem fraco desempenho nos estudos, comportamentos socialmente inadequados. É comum a presença de baixa de autoconfiança (autoeficácia) e pouca tolerância à frustração, o que pode produzir ataques de raiva ou de choro. Possuem tendência a desenvolver transtornos de ansiedade e a manipular os outros para conseguir as coisas. Por outro lado, estas crianças têm boas habilidades sociais e baixos níveis de depressão. Estes pais têm receio de frustrar os desejos e anseios de seus filhos por medo de causar-lhes algum tipo de trauma. Eles acreditam que o carinho, o afeto e o acesso a tudo que eles podem oferecer (de bens e serviços), será suficiente para que esta criança cresça “bem”. Todavia, não é “bem” assim que funciona o desenvolvimento saudável da criança, ela também precisa de LIMITES. Criança sem limite, na idade adulta, passa ter recorrentes as situações de agressão (verbais ou físicas) a figuras de autoridade (professores, guardas de trânsito, funcionários públicos) ou reações desproporcionais aos eventos vivenciados, como crises de choro. De uma forma geral, há dificuldade para lidar com sentimentos negativos. Diante da tristeza ou da angústia é comum o uso de medicamentos ou drogas psicoativas para fugir desses sentimentos negativos, e voltar para o bom humor e a produtividade. Além disso, é comum a presença de comportamentos compulsivos, como compra compulsiva, compulsão alimentar, compulsão por internet, compulsão sexual, e compulsão por jogos (eletrônicos ou não), e outros como automutilação, cleptomania, arrancar cabelos. Tudo isso para fugir dos sentimentos negativos e sentir algum alívio. Em muitos desses casos, a origem está em uma criança (ou adolescente) que não teve limites e não aprendeu a lidar com sentimentos negativos. A relação pais-filhos precisa de carinho e afeto, bem como de regras e limites, que envolve frustrar vontades e ensinar a ouvir “não”. É como o corrimão de uma escada, ao mesmo tempo que é limite, também é proteção. Uma escada sem corrimão não tem limite, e com isso se torna perigosa. Da mesma forma, crianças sem limite, acabam tendo mais medo do que deveriam ter, e frequentemente se sentem inseguras. A tolerância a frustração não é perigosa, pode e deve ser ensinada desde a infância por pais e educadores. O modelo de educação em que tudo é permitido, acaba gerando risco de problemas de comportamentos e transtornos mentais. Se você ainda tem dúvidas sobre como lidar com seu filho, procure um profissional.
Compartilhe este texto com as pessoas que você acha que também podem se beneficiar.
Para entrar em contato com os autores: